Sistema complexo e dinâmico
Entenda o que norteia as orientações oficiais em Pelotas
Decisões das equipes de segurança e das autoridades são embasadas por trabalho de especialistas das áreas da meteorologia e da hidrologia
Foto: Gustavo Vara - Ascom - Sala de Situação, montada no 9º Batalhão de Infantaria Motorizada, concentra todos as autoridades e profissionais envolvidos no monitoramento
Por Gustavo Pereira e Heitor Araujo
O cenário do clima é complexo e dinâmico, afetado por vários fatores. Muitas vezes, impede certezas. Em Pelotas, autoridades e equipes de segurança vêm tomando decisões embasadas por especialistas das áreas da meteorologia e da hidrologia. Mas por que, afinal, as orientações mudaram tão rápido?
Nesta terça-feira (14), a prefeita Paula Mascarenhas (PSDB) anunciou a redução das regiões vermelhas no mapa de risco da cidade. Após atingir no domingo a mesma cota da enchente de 1941, o Canal São Gonçalo apresentou diminuições constantes e, conforme os especialistas, não deve ultrapassar os 2,88 metros até o final de semana.
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Nesse sentido, há uma variável climática que influencia e escapa ao modelo implantado: o vento. A mudança de leste para sudoeste, na madrugada de segunda-feira, direcionou a água para outra margem da Lagoa dos Patos. Consequentemente, o Canal São Gonçalo, que estava cheio em função do nível também alto da Lagoa Mirim (região onde choveu muito), consegue desaguar na Lagoa dos Patos.
Assim, a Lagoa Mirim também flui melhor. Mesmo caso do Canal Santa Bárbara, que deságua no São Gonçalo. O nível alto do São Gonçalo também prejudicava a fluidez do Arroio Pelotas, que não conseguia escoar. Como ressalta a hidróloga Tamara Beskow, integrante da equipe de trabalho que atua junto à Prefeitura de Pelotas, todos esses fatores foram avaliados.
“Se o vento não tivesse mudado, a tendência na madrugada de ontem [segunda-feira] era de que a situação se agravasse. O sistema é extremamente dinâmico, e às vezes uma variável alterada provoca um impacto em toda a região”, explicou a especialista durante a manhã desta terça-feira, na Sala de Situação, que fica no 9ª Batalhão de Infantaria Motorizada (9º BIMtz).

Previsão de pouco vento
O meteorologista Henrique Repinaldo também integra a equipe de especialistas. Nesta terça, ele afirmou que, na região da Lagoa dos Patos, os ventos eram sudoeste em velocidade de 25 a 30 quilômetros por hora. De acordo com Repinaldo, a quarta e a quinta devem ter pouco vento na lagoa, ou seja, o vento tende a deixar de impactar no escoamento, gerando um deslocamento natural das águas até o oceano, em Rio Grande.
Tamara comentou sobre esse caminho rumo ao Atlântico. “Temos bastante água da Lagoa Mirim passando pelo São Gonçalo em direção ao Canal da Barra [em Rio Grande]. A mudança dos ventos fez com que o problema não fosse visível aos nossos olhos. A gente continua tendo um volume bastante significativo escoando pela Lagoa dos Patos. Prova disso é que a corrente no Canal da Barra tem mostrado valores bastante consideráveis. O canal lá está fluindo, a gente está colocando bastante água da Laguna dos Patos para o oceano e isso é positivo”, disse a hidróloga.
Confiança nos modelos
A prefeita Paula Mascarenhas reforça que, apesar da flexibilização do mapa, é necessário se manter em alerta a respeito da nova cheia do Guaíba. O nível da água em Porto Alegre voltou a subir nos últimos dias e, conforme especialistas, pode chegar a 5,50 metros. Daqui a cerca de uma semana, a Lagoa dos Patos passará a receber essa água. Só depois, então, poderá haver uma previsão mais certeira, principalmente considerando os ventos, sobre os efeitos na Zona Sul.
“Tínhamos um modelo matemático que calculava quando essas águas iam chegar. E eles acertaram, as águas estão chegando. No entanto, aquele modelo matemático não levava em conta os ventos. Como os ventos viraram e estão em posição favorável, as águas estão chegando mas não naquele nível que poderia nos prejudicar”, enfatizou a prefeita em live.
Os especialistas da UFPel que integram o comitê de tomada de decisões na Sala de Situação vêm chamando a atenção, constantemente, à falta de equipamentos adequados para o monitoramento em tempo real e mais complexo sobre os fatores hídricos e meteorológicos.
Durante a reunião na manhã desta terça-feira, Paula admitiu que isso pesa na hora de ter maior assertividade nas previsões. "Temos o sistema falho de acompanhamento e monitoramento. Essa crise climática tem que servir para essa mudança, que a gente tenha sistemas confiáveis permanentes nas nossas águas e mananciais", disse.
Paula falou, ainda, sobre a decisão de liberar as áreas que, no momento, não apresentam o mesmo risco de inundação. "Não tem sentido manter tanta gente no abrigo desnecessariamente, a mais longa permanência acaba criando tensões entre as pessoas ", argumentou. A prefeita admitiu, também, que não há equipe da Prefeitura suficiente nos locais, que acabam sendo mantidos pelos voluntários.
A gestora pede para que a população siga acompanhando as informações oficiais e lembra que o cenário pode mudar todos os dias, já que o monitoramento é incessante. Apesar da perspectiva de tranquilidade até o final desta semana na região, a situação do Estado permanece crítica, salienta a gestora.
“Minha responsabilidade é compartilhar o cenário a cada dia com vocês, até para que a gente adquira confiança nesse modelo. Efetivamente, tudo que está sendo previsto está acontecendo. Eventualmente muda o vento antes da hora e muda o cenário, mas a gente tem uma confiança bastante grande no que os especialistas, hidrólogos e meteorologistas, estão nos trazendo”, assegura a prefeita.
Papel do dique
Outro tema importante envolve os sistemas de contenção construídos na cidade. Paula abordou esse assunto.
“O nosso sistema de contenção, o nosso dique, foi testado no domingo. Tivemos o pico, até agora, quando as águas do São Gonçalo atingiram 2,88m, o mesmo índice de 1941, quando não havia o dique. O nosso dique sustentou, então não tivemos maiores problemas, a não ser na região da Z-3, que não tem essa proteção, e na região do Laranjal, onde o dique, que fizemos em 2015, não teve uma altura, o São Gonçalo subiu mais do que ele e avançou ali para o Valverde”, disse.
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